O que é NOVELA?
A NOVELA, de Massaud Moisés
O subgênero novela, segundo Massaud Moisés, se desenvolveu por volta dos séculos II a. C. a III d. C. . Foi cultivada nessa época de maneira embrionária. “O texto mais antigo data provavelmente daquela centúria: Nino e Semíramis, de autor desconhecido, de que se conhecem três fragmentos.”
A Novela renasceu com o Renascimento na Europa, por volta dos séculos XVI e XVII foi dos clássicos mais lidos, as novelas de cavalaria eram os tipos mais lidos, além das históricas e satíricas, ou pitorescas.
Podemos organizá-las do seguinte modo:
- novelas de cavalaria;
- novelas sentimentais e bucólicas;
- novelas picarescas;
- novelas históricas;
- novelas policiais e de mistério.
“Com o Dom Quixote (1605, 1615), Cervantes não só constrói a obra suprema da novela de cavalaria , como ergue a novela ao mais alto ponto atingido antes ou depois.”
A novela se moderniza com a chegada do romantismo. “A estética romântica, com sua demofilia, transforma a novela num de seus meios prediletos de atingir os leitores.”
“No século XIX, proliferaram as infindáveis novelas de folhetins, estampadas nos jornais e depois reunidas em volume. Algumas vezes, a garantia de acolhimento por parte do público, notadamente o feminino, fazia que os editores lançassem as novelas em livro, em vez de fragmentá-las em capítulos semanais ou quinzenais.”
“A época de esplendor da novela em Portugal, o Romantismo. Não pequeno número de prosadores dedicam-se a essa modalidade de narrativa: Garrett, Herculano, etc”
“Encarada como modo de conhecimento, a novela ilude e mistifica, por imprimir aos episódios um movimento acelerado e cheio de novidades, que não pode ser o do cotidiano.[...] A novela contempla, não indaga, finge, não questiona, fantasia, não interroga.”
“Não significa que todo romancista seja superior a todo novelista, mas que o nível atingido pelo mais talentoso dos romancistas é sempre superior ao equivalente em matéria de novela.”
“À semelhança do capítulo referente ao conto, iniciemos pela ação. Do confronto das narrativas mencionadas no item destinado ao histórico da novela depreende-se que é essencialmente multívoca, polivalente: constitui-se de uma série de unidades ou células dramáticas. De onde se segue que a primeira característica estrutural da novela é sua pluralidade dramática: ao invés do conto, que gira em torno de um conflito, a novela focaliza vários. E cada um deles apresenta começo, meio e fim.”
A novela, segundo MOISÉS, é formada por um conjunto de contos em uma determinada ordem. “As células dramáticas organizam-se numa ordem sequencial, uma após outra, em rosário.”
“O novelista não esgota por completo o conteúdo de uma unidade para depois efetuar o mesmo com as seguintes: no fim de cada episódio, procura deixar sementes de mistério ou conflito para manter aceso o interesse do leitor. É raro que esvazie o recheio dramático duma célula antes de prosseguir, pois frustraria a curiosidade do leitor.”
“Em suma multiplicidade dramática, numa corrente horizontal. Por isso, o número de páginas pode crescer à vontade: a pluralidade pressupõe uma estrutura aberta, de modo que novos episódios possam adicionar-se numa cadeia sucessiva, assim como o fim provisório da narrativa implica a multivocidade.”
“A estrutura linear e plural da novela lhe impõe limitações: não lhe interessando, ou não podendo, em razão da economia interna, seguir os passos das personagens desde o nascimento, surpreende-as no momento em que estão maduras para agir. De onde reduzir-lhes o passado a umas poucas linhas, àquilo que colabora para esclarecer-lhes o modo de ser e diz respeito ao fulcro da narrativa. Quanto ao futuro, pertence ao imponderável, à lei do acaso, que pode conduzir à morte, ao exílio, ou a formas equivalentes de sair de cena”
“O tempo da novela é o histórico, assinalado pelo relógio ou pelo calendário, ou pelas convenções sociais. O presente é categoria dominante, em que pese às referências sumárias ao pretérito. Tudo se passa como se os dias, as semanas, os meses e os anos, de efêmera importância, significassem muito. A ação desenrola-se por inteiro no presente, aqui e agora: condensado o pretérito em breves anotações”
“A noção de espaço, inextricavelmente ligada à de tempo, acompanha-lhe de perto o desenvolvimento dentro da novela. Como esta se organiza em torno de episódios sucessivos, cria-se um dinamismo acelerado semelhante à pressa no cinema mudo. Tais características implicam a ausência de unidade espacial. Aborrecendo ficar num único lugar, as personagens buscam, no deslocamento físico, dar fim à angústia, ou atender ao gosto pela aventura. A pluralidade do espaço é, pois, marca distintiva, ainda que a ação se realize numa só cidade.”
“À semelhança do conto, a estrutura da novela caracteriza-se por ser plástica, concreta, horizontal. Assumindo as mais das vezes a perspectiva da terceira pessoa, o autor se coloca fora dos acontecimentos, ou concede a uma personagem a direção da narrativa. A vida imaginária sobrepõe-se à vida observada: o novelista concentra-se em multiplicar os expedientes narrativos, formulando sucessivas células dramáticas, sem atentar para os imperativos da verossimilhança. O enredo, além de visível, não esconde nada, não dissimula profundidades dramáticas ou psicológicas: com o predomínio da ação, tudo o mais se torna menos significativo.”
“A linguagem da novela caracteriza-se, antes de tudo, pela simplicidade: a metáfora, quando presente, há de ser despojada, de imediata apreensão. O narrador se esmera em dirigir-se ao leitor dum modo direto, sem retoricismos, ou com o mínimo de sofisticação: entre a chamada linguagem figurada e a linguagem própria, decide-se pela segunda.”
“Os recursos expressivos (diálogo, narração, descrição, dissertação) acompanham a metamorfose decorrente das circunstâncias internas da novela. O diálogo, não obstante o alargamento da perspectiva horizontal e a pluralidade dramática, predomina, mas sem o relevo que ostenta no conto.”
“Quanto às personagens, o panorama muda de figura em relação ao conto. Em decorrência da multiplicidade dramática, a população da novela não conhece limite, salvo o imposto pela própria extensão do entrecho. Os protagonistas centrais tornam-se numerosos, e as personagens secundárias aparecem com frequência: em razão do entrelaçamento de dramas, o ficcionista engendra numerosos coadjuvantes, cuja ação, momentânea e ocasional, pode não ter consequência futura.”
“Em suma: as personagens da novela são planas, ou bidimensionais, carentes de profundidade, estáticas e definidas.17 E podem ser substituídas sem comprometer a obra, uma vez que ao novelista interessam menos do que a ação: agentes da ação, instrumentos de peripécias, não estabelecem com elas nexos de causalidade ou necessidade.”
“O ritmo da novela é acelerado, precipitado, decorrente do fato de basear-se mais na ação do que nos caracteres. Essa predominância da ação resulta de que o leitor deseja resposta à sua insaciável pergunta: e depois? e depois? Pouco interessado na sondagem psicológica, busca o enebriamento resultante de peripécias sem conta, submetidas a um galope frenético. Visto que o tempo da ação acompanha os ponteiros do relógio, o problema dos novelistas reside no modo como entrelaçar as células dramáticas, de acordo com um andamento que se deseja avassalador e subordinado à cronologia histórica e espacial. Para consegui-lo, têm à mão os seguintes recursos:
- As personagens centrais permanecem ao longo das unidades dramáticas, aglutinando-as e servindo de elemento catalisador para as peripécias que nelas se desencadeiam.
- Os protagonistas centrais vão sendo substituídos a cada episódio, em progressão: a passagem de uma célula para outra dá-se pelo acaso ou pela morte do herói, e a consequente substituição por um seu herdeiro ou figurante próximo.
- A substituição se opera graças a um nexo de parentesco entre as personagens, de modo que a substituta fosse secundária no episódio anterior: filho do protagonista, ou agregado, ou mordomo, etc.”