"Como que do dia pra noite meus parentes e amigos se tornaram fascistas?"

Temos ouvido muito essa frase esses dias. E a verdade, meus amigos, é que eles não viraram fascistas.

O fenômeno do bolsonarismo é a expressão direta da crise de regime e do desgaste com o PT, o PSDB e os demais partidos. Para o Manuel da padaria, o peão da fábrica e o garoto pobre e negro do fundão da periferia, que estão putos com tudo e todos, Bolsonaro é o único que aparece como alguém que peita tudo isso e se propõe a aniquilar o "sistema".

Evidente que o núcleo duro de Bolsonaro é composto por uma militância ideológica, profissional e que sabe muito bem o que faz. Tem por trás uma monstruosa rede de whatsapp e fake news capaz de neutralizar qualquer notícia negativa que possa atingir o candidato. Utiliza-se da decadência e crise de confiança da imprensa burguesa pra impor sua própria ‘narrativa’. E tem um projeto político definido que se resume a uma política econômica ultraliberal na base do porrete.

Mas uma grande massa de pessoas que declaram seu voto a Bolsonaro passa ao largo disso. Não são os robôs russos que vomitam impropérios nas redes sociais. Mas gente como o peão, o garoto ou o seu Manuel. Para eles, como está não dá mais pra ficar. E pense bem, mais de 30% da sociedade brasileira é fascista ou defende a ditadura e quer abrir mão do 13º ? O mundo é bem maior que a sua bolha no Facebook ou a caixa de comentários do G1.

A polarização insuflada pelo PT e satélites cristalizou essa faixa de eleitores da ultradireita. Não é difícil entender. O PT desacreditado, o vice da Dilma metido em corrupção e descendo o sarrafo nos pobres. E a grande política da ‘esquerda’, qual é? Lula Livre! A única opção antissistema que apareceu pra massa foi essa. E esse processo, por sua vez, vem nos últimos meses fortalecendo os tais núcleos duros do bolsonarismo que, minoritários, expandem-se e colocam a cabeça pra fora. Uma das piores coisas que foi feita esses anos foi tachar de 'coxinha', alienado, golpista e tudo o mais todos esses setores putos e desencantados com os políticos e o regime. Quem lhe abriu os braços? Isso mesmo.

Fizemos a maior greve geral da história que poderia ter posto abaixo não só a reforma trabalhista como o próprio governo Temer. PT, CUT e os corruptos da Força enterraram qualquer continuação desse movimento. A CSP-Conlutas defendeu sozinha uma nova greve geral, mas a traição falou mais alto. Na greve dos caminhoneiros, quem foi lá se solidarizar com os caras? Quem acusou de lockout? Pois então.

Cada vez que você chama o seu Manuel de fascista, mais ele se convence a votar em Bolsonaro. E mais ele é ganho a esse projeto.

A forma de desconstruir Bolsonaro é mostrar a essas pessoas, seus amigos, o pessoal da quebrada, os trabalhadores das fábricas, que o que Bolsonaro quer fazer é tirar seus direitos, sua aposentadoria, e até seu 13º. Que, eleito, ele vai continuar governando para os banqueiros e grandes empresários. Como prega Paulo Guedes, privatizar tudo pra pagar a dívida aos banqueiros. Com a diferença nada trivial de que sob a mira de uma baioneta se preciso for. Que Bolsonaro não vai quebrar o ‘sistema’, mas que é a pior parte dele.

E o mais importante, de que ele está certo em estar puto com tudo. De que dessa gente, não podemos esperar nada mesmo. Que esse regime falido e podre não deve ser restaurado, mas explodido de vez. Mas que isso não se faz com um projeto político corrupto, entreguista e autoritário como o de Bolsonaro. Cuja primeira vítima vai ser ele mesmo. Se sai dessa situação com a organização da classe trabalhadora, dos pobres, com luta, com rebelião, pondo abaixo esse regime e esse sistema que nos massacra cotidianamente.

Os governos do PT criaram essa situação que estamos hoje. E depois ainda se eximiu de combater Bolsonaro com a doce ilusão de que este seria um alvo fácil a ser abatido num futuro segundo turno. Mais uma vez, a ilusão eleitoral e o projeto de poder do PT (que prevê além de tudo mais do mesmo) vai nos levando à barbárie.

Não caia, então, nesse jogo. Bolsonaro deve ser combatido e derrotado. Sem trégua. Seu pessoal próximo, incluindo os altos militares que vivem de mamatas e privilégios e querem a democracia do torniquete, também. Já os trabalhadores, o garoto da perifa, o seu Manuel, devem ser ganhos contra esse projeto. E isso não se faz apresentando como alternativa a mesma coisa contra o qual, muito justamente, já perderam a paciência.