COTIDIANO 3
Acorda sempre triste. Um despertar mal-acordardo de uma noite fria mal-dormida. A imensidão turva do dia sacode seus pensamentos e o faz lembrar da sua infância perdida. Infância que nunca teve. Infância adulta no nascimento: infância judiada. Até o pássaro que outrora gorjeou na beirada daquela árvore - casa sua, desparedada - debandou-se solitário para ir beber em outras fontes, deixando-o só na atmosfera fria de sua solidão. Sozinho e famélico, caminha imundo pelas esquinas sujas e cinzas, feito gente-animal-desfigurado. Sem ânimo nem forças, desiludido, ofendido e sem esperança de que um dia essa agonia se acabe.
